Ser rápido na Fórmula 1 é importante, mas não é tudo. Para vencer corridas e campeonatos um piloto precisa ter uma preparação física de atleta, regrada durante o ano inteiro, incluindo o período de férias entre as temporadas, durante o inverno europeu.

O que levará um carro até o final nas primeiras posições é a consistência: ser rápido durante toda a prova. Com todo o esforço de volante, trocas de marcha e a aceleração lateral de 4G durante as curvas, só é possível chegar bem se o condicionamento físico do piloto estiver em dia.

Durante a carreira Ayrton Senna teve grandes profissionais ao seu lado para auxiliá-lo na preparação e no condicionamento físico. Um deles foi o austríaco Josef Leberer, fisioterapeuta que chegou na McLaren em 1988, assim como o brasileiro.

Ayrton Senna brincando com o amigo e fisioterapeuta da equipe Joseph Lerberer, no GP da Australia em 1992.
Ayrton Senna com Nuno Cobra no Centro Poliesportivo em 1989, no Brasil
Ayrton Senna em sessão de massagem na sua residência em Portugal com fisioterapeuta Joseph Lerberer em 1993
Ayrton Senna fazendo alongamento em Angra dos Reis em 1992
Ayrton Senna fazendo treino de resistência muscular no Centro Poliesportivo, no Brasil

Aos poucos, os dois viraram amigos e, além do trabalho que realizavam juntos, também colecionaram histórias divertidas, como o próprio fisioterapeuta lembra em entrevista para o site oficial Ayrton Senna.

“Embora conhecesse o Ayrton desde 1986, quando Willy Dungl (mentor de Leberer) lançou seu novo centro de treinamento, nosso trabalho só começou de forma oficial na temporada de 1988 na McLaren, justamente no GP Brasil de F-1″, diz Josef, citando a prova que naquela época era disputada no circuito de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. “Ayrton já possuía uma boa forma física, mas não o suficiente (para um atleta): era muito leve. Ele tinha uma mente muito forte, mas fisicamente existia uma melhora a ser feita. Passo a passo, ele conseguiu isso”.

O ano de estreia dos dois na McLaren não poderia ser melhor: Senna conquistou o título mundial de F-1 pela primeira vez, após uma decisão épica em Suzuka, onde finalmente venceu o duelo interno contra o então bicampeão mundial Alain Prost, seu companheiro de equipe.

“Senna era uma pessoa muito atenciosa e generosa. Eu lembro que em 1988, quando ele ganhou seu primeiro campeonato de F-1, ele me convidou para ir até Paris para eu estar na entrega de prêmios da FIA. Ele me mandou uma passagem aérea de classe executiva de Salzburgo (Áustria) até Paris, e ainda pagou quatro diárias para mim no Hotel de Crillon. Nada mal!”, brinca o sempre bem-humorado austríaco.

Outra história curiosa de Josef com Ayrton envolve um outro gênio do esporte mundial – e também brasileiro. “Logo depois que Ayrton venceu a primeira corrida no Brasil, em 1991 em Interlagos, nós estávamos em um bar em São Paulo e ele disse: ‘Joseph, eu gostaria de te apresentar para um grande amigo… Simplesmente era o Pelé! Alguém tirou algumas fotos em seguida, mas eu não consegui guardá-las. Um pouco estúpido, eu sei…”, brinca Leberer, que hoje ainda trabalha na Fórmula 1 como responsável pela preparação dos pilotos. Inclusive trabalha com outro brasileiro: Felipe Nasr, na equipe Sauber.

Aos poucos, o atleta Ayrton Senna foi sendo aprimorado e o talento recebia um combustível extra: a parte física e mental, extremamente importante na hora de disputar seu primeiro título mundial. Esta foi parte fundamental do trabalho do piloto brasileiro com outra peça chave quando falamos de sua preparação: Nuno Cobra, conhecido como um dos principais mentores de Senna na carreira.

Ao longo dos anos como piloto de competição, Senna teve que dar saltos em termos de preparação física e mental. Do kart para os fórmulas – mais do que isso, as corridas na Europa exigiam também adaptação ao estilo de vida diferente. Por fim, ao chegar na F-1, o desafio físico era bem mais intenso, já que os carros eram mais difíceis de guiar e as corridas eram três vezes maior do que as de F-3 Inglesa, por exemplo.

Em 1984, quando Ayrton conquistou seu primeiro ponto na F-1, teve que ir logo na sequência para o centro médico assim que a corrida terminou na África do Sul. Com dores nas costas e no pescoço. Ayrton percebeu que ali era um momento chave para o restante da sua carreira.

“Um piloto não pode dar o melhor de si nas primeiras quatro ou cinco voltas e depois estragar tudo, jogando fora uma boa colocação. É claro que a consistência não é apenas uma qualidade natural, mas o resultado de um longo e duro treinamento físico, que lhe dá condições de expressar o melhor de si e chegar ao final das corridas, mesmo as mais árduas, nas mesmas condições com que as iniciou.”

Ayrton Senna relatou séries de treinamento diárias começando logo às 8h30 da manhã, com cinco quilômetros de corrida e atingindo 15 quilômetros por dia no final de um mês. Todo o preparo aeróbico tem como objetivo a oxigenação perfeita do corpo.

O cuidado com a musculatura do pescoço é um item característico dos pilotos de corrida. Exercícios de alongamento e fortalecimento da área são importantes para que não se sofra com os efeitos de aceleração lateral (força G), mas outras partes do corpo não são esquecidas: há séries completas para pernas, braços, abdômen, costas e tórax.

Depois que a temporada começa, os pilotos devem manter um ritmo de treinamento que lhes proporcione chegar até o fim da temporada no mesmo pique. Isso inclui os exercícios de musculação e, no caso de Ayrton Senna, as corridas semanais.

“A pilotagem é predominantemente uma questão de controle na qual o homem não cria o movimento. Uma boa preparação física permite desenvolver essa atividade da melhor forma e no mais alto nível ao longo da temporada.”